A NOTA PESSOAL DE BOLSONARO SOBRE A TRAGÉDIA E O HUMANO E DESUMANO EM NÓS


Por Reinaldo Azevedo

Depois de mais de seis horas da tragédia de Suzano, o presidente Jair Bolsonaro recorreu ao Twitter para se referir ao fato. Afirmou, no mesmo dia em que disse que dorme com uma arma ao lado da cabeceira, embora seja uma das pessoas mais bem guardadas do mundo, o seguinte: "Presto minhas condolências aos familiares das vítimas do desumano atendado ocorrido hoje na escola Professor Raul Brasil, em Suzano. Uma monstruosidade e covardia sem tamanho. Que Deus conforte o coração de todos". Entendi, sim, o sentido da palavra "desumano" no contexto. Empregamos o vocábulo como sinônimo de "cruel". É assim, por exemplo, no Artigo V da Declaração dos Direitos Humanos: "Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante". O presidente já deu mostras de discordar de seu conteúdo. Não só porque já fez a defesa aberta da tortura e tem um torturador como ídolo, tantas vezes cantado em prosa e verso, como também por ser adepto de uma tirada brutalista: "Direitos humanos para humanos direitos". De todo modo, nesse estrito sentido, o que se viu em Suzano foi, com efeito, desumano. Mas é preciso refletir um pouco mais. Há uma perspectiva idealista embutida naquele Artigo V: parte-se do princípio de que humanos não fazem determinadas coisas, não é?; entende-se a condição humana, seja para sofrer agruras, seja para impingir o sofrimento, a partir de uma linha de corte. É como se disséssemos a nós mesmos: "Ah, não, uma pessoa seria incapaz de fazer tal coisa". Infelizmente, pessoas praticam atos odiosos, degradantes, cruéis. E, lamento dizer, eles também são "humanos". Porque maravilha e horror se mesclam na espécie. O horror, presidente, já serviu de guia a governos. A desumanidade, pois, já esteve no poder. E todas aquelas atrocidades eram "humanas" porquanto só humanos podem praticá-las. É por isso que líderes políticos e de opinião precisam tomar muito cuidado com o que dizem e fazem. Quem formula políticas públicas precisa estar atento ao humano como "aquilo que diz respeito à espécie humana". E, sob certas circunstâncias e a depender dos estímulos", temos os atos abomináveis, até porque essa categoria — que é, sim, moral — não se aplica às demais espécies. A consciência, boa ou má, também é uma exclusividade humana. Se "humanista" ou não, eis uma questão que deriva de outras escolhas. A solidariedade do presidente é dirigida aos que sofrem e, por óbvio, tem o apelo coletivo que seu cargo enseja. Ele nada poderia ter feito para proteger as vítimas; também não tem como devolver à vida os que se foram. Mas ele faz escolhas na condição de governante. É preciso que se pergunte, então, que tipo de humano está sendo convidado ao protagonismo. As opiniões pessoais de um
governante são sempre um convite à ação coletiva. A que Bolsonaro convida os brasileiros?...

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