A popularidade dos mais pobres sustenta Bolsonaro
Por Thomas Traumann
29 abr 2020, 18h06
Quem acompanha a polĂtica de longe fica assustada com a capacidade de o presidente Jair Bolsonaro sobreviver Ă s crises. Para ficar apenas nos Ăşltimos dois meses, o presidente já chamou a coronavĂrus de “gripezinha”, brigou com os governadores, boicotou os esforços de isolamento social, demitiu o ministro da SaĂşde que estava seguindo as normas internacionais, demitiu o ministro da Justiça mais popular que ele, mudou a PolĂcia Federal para impedir investigações contra seus filhos, autorizou os militares a planejarem um Plano B para a economia sem o ministro Paulo Guedes saber, participou de duas manifestações a favor da ditadura e, finalmente, quando perguntado sobre as 5 mil mortes de Covid-19 respondeu “e daĂ? Quer que eu faça o quĂŞ?”.
Depois de tudo isso, os Ăndices de popularidade de Bolsonaro seguem parecidos. De acordo com o Ăşltimo levantamento do Datafolha, trĂŞs dias apĂłs a saĂda de SĂ©rgio Moro do MinistĂ©rio da Justiça e Segurança PĂşblica, a gestĂŁo Bolsonaro Ă© aprovada por 33% dos brasileiros e reprovado por 38%. 48% dos brasileiros sĂŁo contra a abertura de um processo de impeachment contra 45% a favor. Sobre uma improvável renĂşncia do presidente, 50% sĂŁo contra e 46% a favor.
Os nĂşmeros mostram um paĂs dividido, mas tambĂ©m a existĂŞncia uma notável parcela da sociedade que está ao lado do presidente nĂŁo importa o que aconteça. É o que na fĂsica se chama “resiliĂŞncia”, a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar Ă forma original apĂłs terem sido submetidos a uma deformação elástica. Bolsonaro Ă© um resiliente.
Mas por que a saĂda de Moro e Mandetta nĂŁo alteraram os Ăndices do presidente? O motivo está parcialmente contado nos detalhes da pesquisa. Ela mostra que, enquanto os mais ricos e escolarizados passaram a reprovar o presidente por sua gestĂŁo inconsequente na pandemia e demissĂŁo de Moro, os mais pobres passaram a enxergar no ex-capitĂŁo um defensor. Ao se colocar a favor da reabertura das empresas mesmo contra a opiniĂŁo dos mĂ©dicos, Bolsonaro mostrou identificação com os milhões de brasileiros que estĂŁo com medo do desemprego e da falĂŞncia das empresas. Para essas pessoas, a Ăşnica medida positiva que ocorreu atĂ© agora foi o auxĂlio emergencial de R$ 600 reais, que muitos acham que foi obra de Bolsonaro.
Segundo o Datafolha, entre quem tem renda de atĂ© dois salários mĂnimos (aproximadamente 60% dos entrevistados), a taxa de Ăłtimo ou bom do presidente subiu 8 pontos percentuais desde dezembro. Ele tambĂ©m avançou entre trabalhadores autĂ´nomos e informais, com renda familiar de atĂ© trĂŞs salários mĂnimos, habilitados, na teoria, a receber o auxĂlio emergencial liberado pelo governo.
Algo parecido acontece por escolaridade —a reprovação a Bolsonaro cresceu 11 pontos percentuais entre os mais escolarizados nos Ăşltimos quatro meses, mas em compensação a aprovação subiu 8 pontos percentuais entre os que tĂŞm o nĂvel fundamental. Como o Brasil Ă© um PaĂs de pobres e pouco escolarizados, foi como se nĂŁo houvesse mudança.
Essa troca de apoio na base bolsonarista terá efeitos no resto do governo. AtĂ© o ano passado, as prioridades do presidente eram as reformas econĂ´micas, mudanças nos costumes (para agradar o eleitorado evangĂ©lico) e vitimização frente a qualquer adversário, fosse a mĂdia ou a oposição. Agora, mais dependente dos mais pobres, Bolsonaro terá de ter uma bandeira social. É provável que o auxĂlio social, previsto para terminar em junho, seja estendido atĂ© o final do ano.
O teste real sobre a resiliência da popularidade presidencial será visto nos próximos meses, com o crescimento no número de mortes e internações por Covid-19 e no desemprego de milhares de trabalhadores do varejo. Será quando a realidade testará a capacidade de resposta do governo.
Com conteĂşdo Veja
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